POR FORA, BELA VIOLA. POR DENTRO, PÃO BOLORENTO

Com metade dos equipamentos fechados, cultura de Osasco foi abandonada pelas gestões Lins

16 out 2023, 14:44 Tempo de leitura: 5 minutos, 46 segundos
POR FORA, BELA VIOLA. POR DENTRO, PÃO BOLORENTO

por Paula Veneroso

A pandemia da covid-19 foi, sem dúvida, a maior aliada do governo Rogério Lins na área da Cultura. Com a quarentena decretada, todos os espaços públicos foram fechados, o que caiu como uma luva para a gestão: enquanto o chefe do executivo fazia deslanchar sua carreira de blogueiro nas redes sociais, não se sentiu na obrigação nem de conservar nem de reformar os equipamentos culturais da cidade, muitos deles já fechados desde antes da pandemia.
Em meados de 2021, enquanto o prefeito postava, a pandemia dava uma trégua, e a mandata AtivOz percorria os equipamentos culturais da cidade. Nos locais onde conseguia entrar, conversava com os servidores e documentava a situação do equipamento. Não foi possível entrar em alguns deles como, por exemplo, no Museu de Osasco, cujo segundo pavimento estava interditado desde 2017 por risco de desabamento e o restante do prédio fechado totalmente dois anos depois.


No início de 2022, a AtivOz se uniu a um grupo de manifestantes que organizou um ato-abraço coletivo pela preservação do Museu de Osasco e contra a privatização do patrimônio, que sempre é aventada pelo governo terceirizante de Rogério Lins. Ainda no ano anterior, em reunião com a Secretaria da Cultura, promessa de restauro havia sido feita, mas foi mais uma que não vingou.

Degradação disfarçada de restauração


O chalé Brícola – como era conhecido o local do primeiro voo da América Latina antes de se tornar museu –, já é desconhecido por uma geração inteira de estudantes de Osasco, e, a depender da ausência de esforços do governo Lins, não será conhecido por mais ninguém. Para driblar os questionamentos e tirar o corpo fora, a Secretaria de Cultura passou a responder que firmou uma parceria com a secretaria Estadual de Cultura para pensar a restauração do museu, mas que é muito difícil encontrar profissionais qualificados para análise e realização da reforma, pois é necessário um plano museológico. Resumo da missa: continuará fechado, sem prazo para início de qualquer reforma.
Outro equipamento fechado há mais de três anos é o Espaço Cultural Grande Otelo, local para exibição de filmes e apresentação de espetáculos de dança e peças teatrais. A placa na frente do prédio informa “reforma e qualificação” do espaço, com início em 8 de junho de 2020 e término em 6 de novembro do mesmo ano. Entretanto, como nada foi finalizado, alguém, providencialmente, apagou o ano de término da obra. As últimas informações obtidas pela AtivOz foram de que estavam sendo licitados o equipamento de som e projeção e as poltronas. Isso faz mais de um ano.

Umidade, mofo e bolor na biblioteca


A Biblioteca Municipal Monteiro Lobato é praticamente um caso perdido – mas deveria ser caso de polícia tal o descaso com o acervo, funcionários, equipamentos, mobiliário e edifício. Fechada e literalmente abandonada desde 2020, os cidadãos perderam os serviços de acesso gratuito à internet, leitura de jornais e revistas, empréstimo de livros – incluindo acervo em braile –, cursos, oficinas, exposições, palestras e círculos de cultura que eram oferecidos no espaço. Além do acervo, que inclui hemeroteca e mangateca, a biblioteca possuía um auditório para 80 pessoas e um salão multiuso para exposições e instalações artísticas.
Em outubro de 2021, a AtivOz registrou imagens de dentro da biblioteca. São lamentáveis: chove em cima dos livros e nem se tem ideia do quanto já se perdeu do acervo. O local é insalubre; são tantas infiltrações, mofo e bolor que os funcionários foram realocados para exercer outras funções na sede da Secretaria da Cultura. A área externa também foi abandonada: ficou sem roçagem, limpeza e jardinagem durante anos – uma indicação da AtivOz data de outubro de 2021. No início de agosto deste ano, assim que a Rede Globo exibiu reportagem no telejornal Bom Dia São Paulo denunciando o abandono dos equipamentos culturais de Osasco, a prefeitura mandou limpar o terreno da biblioteca. No final de setembro, após sofrer pressão nas redes sociais, o prefeito iniciou uma “reforma relâmpago” no equipamento. A falta de planejamento é tamanha que as obras foram iniciadas sem que os livros fossem retirados ou protegidos. Nem placa de sinalização da reforma, com valor e data de início e término – como manda a lei – foi instalada.

Projetos megalômanos


No mesmo terreno da biblioteca funciona precariamente a Escola de Artes. Lá, além de salas de aula e espaço de exposições, existe um teatro, o Nivaldo Santana. Pelo fato de a prefeitura ter um projeto de construção de um parque das artes no local, os cursos da Escola de Artes foram esvaziados e o prédio deixou de receber manutenção. A ideia do governo terceirizante de Osasco é construir um ambicioso “Parque das Artes” que provavelmente custará milhões, demorará anos para sair do papel e será entregue a administração privada. O projeto desse tal Parque das Artes está sendo a desculpa da vez para o abandono de vários equipamentos culturais.


Na sede da Secretaria de Cultura existe um centro de eventos, o Pedro Bortolosso. Mas, infelizmente, nenhum evento público acontece lá, apenas shows privados e eventos do SESC Osasco – que está alugando o espaço enquanto constrói sua nova sede na cidade. O motivo de não sediar nenhum evento público é risível: o prédio não tem laudo do Corpo de Bombeiros, o AVCB. Então, quando alguma organização privada aluga o espaço, ela se responsabiliza por pagar um laudo provisório, já que a prefeitura, dona do espaço, não providencia.
Por último, cabe lembrar o estado de abandono da Capelinha, no Helena Maria. Remodelada em 1994 com projeto de Oscar Niemeyer, a ausência de conservação deteriorou o espaço, que atualmente está servindo como ponto de descarte de lixo e abrigo para pessoas em situação de rua. Nesse sentido, a situação da Capelinha escancara tanto a falta de políticas públicas em relação aos patrimônios históricos da cidade quanto a falta de cuidado do poder público com a população em situação de rua. Não seria surpresa para ninguém se a gestão higienista de Lins optar por resolver a questão da Capelinha com ações aporofóbicas no espaço, instalando grades e lanças.


Diante desse panorama, a Cultura de Osasco consegue ser o retrato perfeito da gestão Lins na cidade que detém o 7º PIB do Brasil e que dá título a este texto: “por fora, bela viola; por dentro, pão bolorento.